Delação
da Odebrecht entregue ao Supremo tem cerca de 800 depoimentos
Agência O
Globo
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Edilson Dantas/Agência O Globo
A Procuradoria Geral da República entregou na manhã desta segunda-feira
ao Supremo Tribunal Federal (STF) os documentos da delação dos 77 executivos e
ex-executivos da Odebrecht, empreiteira investigada na Operação Lava-Jato. A
papelada e arquivos eletrônicos - que abrangem cerca de 800 depoimentos - estão
numa sala do STF.
A entrega foi feita de forma discreta, da qual participaram servidores
da PGR e do STF. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e o a
presidente do tribunal, ministra Cármen Lúcia, não estavam presentes.
A delação está sob sigilo. Caberá ao ministro Teori Zavascki, relator
dos processos da Lava-Jato no STF, homologá-la ou não.
Uma pequena parte da delação já foi vazada, mas foi o suficiente para
envolver nomes importantes da República, como o presidente Michel Temer (PMDB),
o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) e
vários ministros e parlamentares.
Hoje, o tribunal tem sua última sessão do ano, e só volta a funcionar
plenamente em fevereiro de 2017.
Janot acelerou os trabalhos de colher os depoimentos após críticas de
vários ministros do STF em relação às investigações conduzidas pelo Ministério
Público e pela Polícia Federal, durante sessão ocorrida em 1º de dezembro. O
episódio desagradou o procurador-geral, que resolveu contra-atacar. Acionou
vários procuradores para dar mais agilidade e concluir os depoimentos da
Odebrecht a tempo de entregá-los ao STF ainda este ano.
O tribunal ficou sabendo de última hora dos planos de Janot e, às
pressas, escolheu um lugar para guardar os depoimentos. O material é vasto,
possuindo vários volumes.
Assim que tomou conhecimento, a presidente do tribunal, ministra Cármen
Lúcia, baixou algumas orientações. Ela determinou a criação de uma força-tarefa
para ajudar o ministro Teori Zavascki, relator dos processos da Lava-Jato no
STF. Ele terá um reforço de pessoal e de espaço físico para trabalhar. Somente
o relator e seus juízes auxiliares terão acesso ao material.
Com os depoimentos em mão, caberá a Teori ouvir os delatores ou seus
advogados para saber, por exemplo, se eles foram coagidos ou não a delatar.
Também poderá devolver parte do material a Janot caso ache que ele deva ser
complementado.
O mês de janeiro é de recesso no STF, mas o relator
poderá usar esse tempo para adiantar o trabalho. Caso Teori homologue os
acordos, a Procuradoria-Geral da República poderá prosseguir com as
investigações, usando os depoimentos para embasar novas investigações.
Está tudo armado para
evitar que Lula seja candidato”
Alba
Casas
© uly
martín Tarso Genro, em Madri
Não foi um bom ano para o Brasil: o país acumula uma queda do PIB de 4%;
a presidenta Dilma Rousseff foi deposta em setembro em um julgamento
político; e as labirínticas tramas de corrupção
colocaram em xeque o Governo que a substituiu. A saída do túnel,
segundo Tarso Genro, natural de São Borja, no Rio Grande
do Sul, passa por uma inescapável renovação política. “A crise econômica não
será superada sem que a política seja”, opina o ex-ministro da Educação, de
Relações Institucionais e da Justiça nos Governos de Lula (2002-2009),
governador do Rio Grande do Sul, pelo Partido dos Trabalhadores
(PT), e um dos maiores defensores do Fórum Social Mundial de Porto Alegre.
Para Genro, o impeachment
se baseou em uma “retirada arbitrária da presidenta pela simples formação de
uma maioria política no Congresso brasileiro”, já que “não houve delito de
corrupção nem abandono de suas obrigações presidenciais”. Em sua opinião, o PT
e seus dois principais líderes, Lula e Rousseff, sofreram uma campanha de
descrédito por parte da mídia “que formam um oligopólio no Brasil”. E, segundo
o ex-governador, essa foi a principal causa do descalabro do PT nas eleições
regionais de outubro.
Pergunta. O descrédito não se deve aos
casos de corrupção?
Resposta. Todos os partidos perderam
credibilidade no Brasil devido aos processos por corrupção, que é sistêmica e
endêmica. Mas o PT não é o principal partido acusado
de corrupção nem seus cargos são os que estão sendo majoritariamente
processados. A atenção se concentrou no PT porque estava no poder, o
que é compreensível. Mas Rousseff não caiu devido à corrupção.
P. Por que Rousseff não se demitiu
antes de ocorrer o impeachment?
R. Para Rousseff, e para uma parte
significativa de sua equipe, era difícil acreditar que o PMDB [seu aliado no
Governo] fosse traí-la porque o vice-presidente fazia parte do PMDB. Mas a
traição se baseou exatamente nisso: o vice-presidente queria o poder.
P. Já em 2014, o sr. defendeu a
necessidade de o PT dar uma guinada à esquerda e romper a coalizão com o PMDB.
Por quê?
R. O esgotamento do modelo de
desenvolvimento e as mudanças da economia mundial iam impedir que toda a
população melhorasse, que foi o que caracterizou o Governo de Lula. Era
necessária uma reforma tributária para manter as políticas sociais, reduzindo a
dependência do financiamento internacional. E para isso não podíamos contar com
o PMDB. Mas minha posição não foi majoritária no PT.
As palavras socialismo e socialdemocracia perderam seu sentido
P. Michel Temer [atual presidente]
tem possibilidades de acabar seu mandato?
R. As pesquisas dão um alto índice
de desaprovação ao presidente, que está sendo acusado por empresários de
arrecadação ilegal de fundos para sua campanha eleitoral. Algo de que nenhum
empresário acusou Lula.
P. O sr. conhece o homem por trás
do político. Acredita que Lula é capaz de cometer os crimes do qual é acusado?
R. Lula tem cinco processos e
nenhuma prova sólida contra ele. Se houvesse, já estaria preso.
R. Está tudo armado para impedir
isso. Mas o poder judiciário no Brasil tem uma tradição respeitável. Nós
esperamos que seja possível demonstrar nas instâncias superiores que Lula não
tem responsabilidades penais.
P. A divisão dos poderes está
falhando?
R. O Supremo Tribunal Federal tem
ministros honrados, mas que assumiram posições políticas diante da crise.
Portanto, há um desequilíbrio, mas não há ainda uma ruptura. Para retomar o equilíbrio precisamos
de novas eleições presidenciais. Para que haja uma presidência
legítima e para reformar a política.
Se houvesse alguma prova sólida contra Lula, ele teria sido preso
P. O sr. era vice-prefeito de Porto
Alegre quando se realizaram os primeiros orçamentos participativos em 1988.
Como se pode estimular hoje a participação da população na política?
R. Com respeito e atenção a suas
demandas. Quando as pessoas sentem que são ouvidas, participam. Se não manipuladas,
não. Ou participam uma vez e saem às ruas.
P. Que futuro tem a esquerda na
América Latina depois do triunfo de Mauricio Macri na Argentina e da oposição na
Assembleia Nacional da Venezuela?
R. As palavras socialismo e
socialdemocracia estão perdendo o sentido em nível global. Acredito que houve
uma mudança generalizada na estrutura do capital, o que mudou a estrutura de
classes. E os políticos não mudaram sua visão de mundo nem seus projetos. O
Brasil falhou na hora de encontrar uma saída para a crise dentro do sistema de
capital global. Mas essa saída também não foi encontrada em nenhum outro lugar.
'Grisalhão' e 'Encostado'
seguem incógnitos em planilha
FELIPE BÄCHTOLD
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
18/12/2016 02h00 -
Atualizado às 12h15
Já se sabe quem eram "Todo Feio",
"Caju" e "Las Vegas". Agora, resta descobrir quem são
"Encostado", "Duvidoso", "Casa de Doido" e muitos
outros.
Os três últimos nomes constam em planilhas de
pagamentos da Odebrecht apreendidas pela Operação Lava Jato neste ano. Essas
tabelas mostram pagamentos para dezenas pessoas identificadas apenas por
apelidos, em somas milionárias.
As planilhas estavam com a secretária Maria Lúcia
Tavares, primeira funcionária da construtora a colaborar, ainda no começo do
ano. Ela atuava junto ao departamento de operações estruturadas da Odebrecht,
considerado por investigadores como "um setor de propinas".
No último fim de semana, com a divulgação de
detalhes dos depoimentos do ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho, foi
revelado que, segundo o novo delator, Todo Feio era o ex-deputado paraibano
Inaldo Leitão; Caju, senador Romero Jucá (PMDB-RR) e Las Vegas, o ex-assessor
de Dilma Rousseff Anderson Dornelles. Todos negam ter recebido dinheiro.
A delação dele e dos outros ex-dirigentes da
empreiteira ainda precisa ser homologada pelo Supremo.
A lista apreendida revela uma predileção por
denominações de características físicas (há nomes como "Grisalhão",
"Baixinho", "Comprido"), relativas a animais
("Abelha", "Faisão") e até referências futebolísticas (há o
"Flamenguista" e o "Timão").
Em alguns casos, associam o nome a obras da
empreiteira. Ao lado de "Bobão", por exemplo, e da anotação de um
repasse de R$ 150 mil, consta o nome "Canal do Sertão - lote 4".
Também há duas menções a aparentes pagamentos em
países vizinhos. O codinome "Duvidoso" está ao lado de "Dutos
Argentina", em US$ 100 mil, e "Taça" faz referência ao Peru.
A maioria das planilhas envolve repasses no período
da campanha eleitoral de 2014.
Há uma série de valores para
"Mineirinho", o que, suspeitam investigadores, é uma referência à
campanha à Presidência de Aécio Neves (PSDB) naquele ano. Por meio de sua
assessoria, o tucano disse desconhecer as planilhas mencionadas e que as
doações à campanha ocorreram dentro da lei.
TROCADILHOS
Os operadores também levavam codinomes. Os
pagamentos das planilhas apreendidas com a secretária estavam sob a jurisdição
das contas "Dragão", "Kibe", "Paulistinha" e
"Carioquinha".
Dragão seria o chinês Wu-Yu Sheng, que deu nome a
uma das fases da Lava Jato, a 36ª, em novembro, e Kibe, Adir Assad, que está
preso e já foi condenado.
Maria Lúcia Tavares disse em depoimento que não
sabia quem era os codinomes dos beneficiários das planilhas, com exceção de
"Feira", que se referia à Mônica Moura, mulher do marqueteiro do PT
João Santana.
Segundo a secretária, apenas seus quatro superiores
tinham conhecimento.
Ela afirmou que se comunicava com os distribuidores
de dinheiro por meio de um sistema de informática próprio, que funcionava em um
computador separado.
"Sempre quando os prestadores iam levar o
dinheiro, havia a indicação do endereço, do valor, da senha e da pessoa que
iria recebê-los", disse em depoimento, segundo a transcrição.
Nas tabelas, as senhas geralmente são alimentos,
como "lasanha", "panqueca" e "beterraba", mas
havia palavras como "trambolho", "titios",
"supervisor" e "remédio".
Uma das senhas, "acarajé", virou nome de
fase da Lava Jato, a 23ª, que prendeu João Santana, em fevereiro.
Antes da divulgação dos depoimentos de Cláudio Melo
Filho, uma série de apelidos da Odebrecht já havia sido revelada em março em um
conjunto de planilhas apreendidas com o ex-executivo Benedicto Barbosa Júnior,
da Odebrecht Infraestrutura.
Nessas tabelas, havia menções a mais de 300
políticos de 24 partidos que se beneficiaram de pagamentos em campanhas
eleitorais de 2010 a 2014.
Não há ainda como precisar, porém se os valores
foram efetivamente repassados nem se referiam a doação legal, caixa dois, ou
propina.
Havia vários trocadilhos, como "Ovo",
para se referir ao governador catarinense Raimundo Colombo (PSD), e
"Eva" para um deputado estadual do Rio Grande do Sul, Adão Villaverde
(PT).
Os políticos citados vêm negando ter
recebido dinheiro de maneira ilegal. A Odebrecht não se manifesta a respeito.
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