Colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais
importantes jornalistas brasileiros. Analisa as questões políticas e
econômicas. Escreve aos domingos e quintas-feiras.
Ponto de
encontro
30/06/2016 02h00
Michel Temer e seu governo agem para salvar Eduardo Cunha na Câmara.
Talvez não fosse preciso dizer mais nada sobre a atitude de Temer. Afinal,
apesar de todo o esforço da Lava Jato e dos pró-impeachment para incriminar
petistas, na opinião nacional ninguém simboliza mais a calamidade política do
que Eduardo Cunha. Está dito quase tudo sobre protetor e protegido. Mas Temer
leva a algumas observações adicionais.
Descoberto por jornalistas o encontro sorrateiro de Cunha e Temer na
noite de domingo (26), o primeiro fez o que mais faz: negou. Não falava com
Temer desde a semana anterior. Com a mentira, comprovou que a combinação era de
encontro oculto. O segundo deu esta explicação: "Converso com todo mundo.
Embora afastado, ele é um deputado no exercício do seu mandato".
A frase é uma medida da lucidez de Temer ou da honestidade de sua
resposta ao flagrante: "afastado" mas "no exercício do
mandato". Nada de muito novo. Mas a pretensa justificativa de que
"conversa com todo mundo" excede o aspecto pessoal. Se é isso mesmo,
em quase seis anos de convívio com o Poder ainda não o compreendeu. À parte a
liturgia do cargo, de que Sarney tanto falou, o Poder requer cuidados com sua
respeitabilidade. Ao menos no sentido, tão do agrado de jornalistas
brasileiros, cobrado às aparências da mulher de César.
O sítio de alto luxo não combina, mas não tira o título do Palácio do
Jaburu, nem, muito menos, a sua condição de uma das sedes do mais alto poder
governamental. O recepcionado aí para a barganha de espertezas não é, porém,
como "todo mundo". É um múltiplo réu no Supremo Tribunal Federal, tão
excluído do exercício de mandato que está proibido até de simplesmente entrar
na Câmara dos Deputados, Casa aberta a todos. Proibição, ao que consta, sem
precedente. Não no conceito, de moralidade ao menos duvidosa, que o atual
morador aplica ao uso do palácio de governo.
Eduardo Cunha viu-se necessitado de reforço em duas instâncias. Na
Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, à qual encaminhou recurso contra
a decisão do Conselho de Ética, que o considerou passível de perda do mandato.
E também na substituição de Waldir Maranhão, em exercício na presidência da
Casa, por alguém de sua confiança, para assegurar-lhe decisões favoráveis nas
manobras de defesa ao ser julgado em plenário.
Já na segunda-feira (27), Temer fazia iniciar a ação do seu pessoal em
favor da eleição de Rogério Rosso para presidir a Câmara. É o preferido por
Eduardo Cunha. E viva a nova (i)moralidade.
POR DENTRO DO FORA
A ordem de Michel Temer para suspender a cobertura oficial de sua
presença fora de Brasília não é, como alegado, para reduzir gastos. É nenhum o
custo de um fotógrafo ou cameraman já integrante da comunicação oficial. O
problema está na impossibilidade de eliminar, nas gravações, o frequente
"Fora, Temer", dito ou escrito. Sem encontrar outra solução, foi
considerado preferível eliminar os registros.
Apesar de imprensa e TV não o noticiarem, coros de "Fora,
Temer" estão pelo país todo. No espetáculo do Prêmio da Música Brasileira,
por exemplo, o Teatro Municipal do Rio explodiu em repentino "Fora,
Temer". Coisas assim acontecem todos os dias, numerosas.
ACHADO PERDIDO
Por falar no mal ou não noticiado, a Lava Jato encontrou nas ligações de
celulares de Léo Pinheiro, presidente da OAS, troca de mensagens com Fernando
Bittar tratando das obras no sítio de Atibaia, como proprietário associado a
Jonas Suassuna Filho. Não foi um bom achado para a tese da Lava Jato e da
imprensa/TV sobre a propriedade.