domingo, 23 de outubro de 2016

A mão pesada do Fundo Monetário Internacional



Emiliano José
Jornalista e escritor
Publicado em A Tarde
Imaginávamos até havia pouco tempo não sermos mais importunados pelo espectro do FMI. Mas, sobreveio o golpe. Este, como declarou alto e bom som o presidente alçado ao poder, dado para cumprir o programa apresentado à presidente Dilma por ele, denominado, não se sabe se com alguma dose de ironia, de ponte para o futuro.
Embora seja gigantesca volta ao passado, uma regressão cujas consequências estão à vista. As vítimas, inegavelmente os vinculados ao mundo do trabalho. Preservados, nessa ponte, os interesses rentistas, em torno dos quais gira o atual poder politico.
O FMI, sem meios-termos, voltou a falar grosso. O comunicado do fundo, emitido quinta-feira passada, na primeira visita oficial ao Brasil depois do atentado à democracia concluído no final de agosto, determinou o fim do mais importante instrumento de combate à pobreza adotado nos governos Lula e Dilma, a politica de valorização do salário mínimo.
Entre 2003 e 2015, anotem isso, o aumento real do salário mínimo foi de 76%. Isso alterou o padrão de consumo e foi inegavelmente o principal fator para a redução da pobreza registrada pelo Brasil, segundo o testemunho insuspeito da ONU.
Lula, no inicio de seu segundo mandato, promoveu um acordo com as centrais sindicais, consagrado na sequencia pelo Congresso Nacional.
O salário mínimo passava a ser reajustado anualmente com base na variação do Produto interno Bruto (PIB) do ano retrasado, somado à inflação acumulada do ano anterior, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC)
O FMI exige mais: quer ver quebrada a vinculação das aposentadorias e pensões do INSS ao salário mínimo, e isso afetará a vida de aproximadamente 25 milhões de pessoas e suas famílias. Se tais exigências forem aceitas, representarão um desmonte social de proporções calamitosas e tudo indica são do agrado do atual governo, cujas declarações iam já nessa direção antes de a mão pesada do FMI descer vigorosamente sobre a mesa nessa visita ao Brasil. A jornalista Tereza Cruvinel detalha tudo isso no B247 do último sábado.
Curioso, mas explicável pelo menos dois jornais do último sábado, em editoriais, faziam eco às recomendações do FMI, Valor e O Globo.
Noticiavam a exigência, por parte do fundo de um aperto fiscal mais rigoroso,  lembravam a reivindicação da redução das barreiras tarifárias e não tarifárias para facilitar a vida do capital estrangeiro, abertura completa da economia, receituário conhecido.
E os dois órgãos de comunicação defendiam, na esteira da exigência do FMI, a incapacidade de o Tesouro suportar o peso das pensões de outros benefícios se  indexados ao salário mínimo.
 Assim como o FMI, querem a politica de fixação de teto para as despesas públicas estendidas a Estados e municípios. E lançam a responsabilidade de tudo sobre a Constituição de 1988, desastrosa no campo dos benefícios sociais na avaliação de O Globo.
Ao propor mais e mais arrocho, o FMI argumenta ser limitada a adoção da politica do teto para as despesas públicas, cujas consequências, como se sabe, serão dramáticas para as principais politicas públicas. Levará muito tempo para provocar a estabilização da dívida e do déficit público. Por isso quer mais austeridade – a palavra conhecida dos europeus, onde o desemprego se espalhou, a crise não foi debelada e o capital financeiro foi preservado.
O neoliberalismo, em estado, puro, mostra novamente a sua cara, e foi em nome dele e descarte de 54 milhões de votos e a retirada de cena de uma mulher reconhecidamente honesta, a quem nem seus adversários foram capazes, porque impossível, de acusar de qualquer ilícito, qualquer desonestidade, salvo o que chamaram pedaladas.
Não se avalia como a população vai reagir a esse desmonte das politicas públicas. Que vai, vai.

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