Fonte:Bahiaeconômica
P: - O sr. disse que está "cautelosamente otimista" com o Brasil. Por quê?
Nouriel Roubini - Os investidores estão céticos porque veem fraqueza política da presidente e acham que o ajuste não vai acontecer. Assim, o real continua caindo. Mas a presidente não tem escolha. A menos que seja irracional ou politicamente suicida, o que não acredito que seja, ela vai insistir no ajuste, como disse no discurso de domingo.
P:Quando o Brasil vai voltar a crescer?
N.R: Se ela fizer o ajuste agora e mudar suas
políticas, terá um ano muito difícil, sem crescer ou com pequena
recessão. No ano que vem será um pouco melhor, pode crescer até 1,5% e
ter outros dois anos de crescimento OK. Se não o fizer, o real sofrerá
queda livre, o Brasil vai perder o grau de investimento. Ela sabe que o
segundo mandato poderá se tornar um desastre.
P: A presidente culpou a crise internacional. O sr. concorda?
N.R: Certamente há fatores internacionais que afetam a
economia brasileira, como a desaceleração global e especialmente a da
China, e a queda nos preços de commodities, como o minério de ferro. Mas
a fraqueza econômica do país neste ano se deve a quatro anos de
políticas macroeconômicas erradas. Monetárias, fiscais, de crédito
erradas, muito frouxas. Depois de a presidente se reeleger, ela percebeu
que precisava de um ajuste difícil. Cortar despesas, aumentar receita,
apertar o cinto, controlar a inflação. 2015 será um ano muito difícil.
Provavelmente de recessão, com desemprego e inflação em alta.
P: O mercado continua cético.
N.R: Porque acha que Dilma não queria Levy, que ele
foi imposto pela crise, e também acha que ela não pode corrigir seus
erros. O mercado não acredita no comprometimento, quer ação, não
palavras. Mas, pessoalmente, estou mais otimista que o empresariado
brasileiro.
P: O sr. diz que o boom das matérias primas, que tanto beneficiou as
exportações brasileiras à China, esgotou-se. Como o Brasil pode voltar a
crescer?
N.R: O Brasil é uma economia grande. O consumo
doméstico pode crescer e a desvalorização do real pode reduzir o deficit
externo.Mas o país precisa aumentar investimentos públicos em
infraestrutura, incentivar as parcerias público-privadas. O potencial de
crescimento do Brasil não é grande, mas 3% seria alcançável. No
primeiro mandato da Dilma, houve algumas concessões de aeroportos e
portos, mas de forma muito lenta. Imagino que Levy busque essa
liberalização também. A direção é a correta.
P: No ano passado, o sr. disse que os emergentes não souberam
aproveitar a bonança das exportações de commodities e fizeram escolhas
erradas no "capitalismo de Estado". O sr. pensava no Brasil?
N.R: O capitalismo de Estado no Brasil pode se ver
pelo que aconteceu com a Petrobras, que embarcou em projetos caros que
não eram viáveis. Políticas de conteúdo nacional excessivo e que
dificultaram a participação de investidores de fora deram errado.Elas
abriram as portas para o protecionismo, a esquemas de propinas. Menos
competição para conseguir contratos. Houve uma atmosfera que distorceu
as decisões que fariam sentido para a empresa. Sem esquecer do papel
excessivo do BNDES no crédito, dos bancos estatais, das empresas
estatais. Mas o Brasil não é a Argentina nem a Venezuela.
P: Com a desaceleração, deixamos de correr o risco de uma bolha imobiliária?
N.R: Não vejo uma bolha imobiliária para estourar no
Brasil. Há bolsões de algumas áreas urbanas com preços altos demais, que
serão corrigidos. O crédito imobiliário ficará mais apertado. Mas é um
país de população jovem, de uma classe média que ainda tem potencial
para crescer, então a demanda por imóveis vai continuar.
P: O PIB dos EUA deve crescer acima de 3% em 2015 e 2016. É sustentável?
N.R: Os EUA estão crescendo acima do seu potencial, de
uma economia já madura. Há uma robusta criação de empregos -está
chegando ao pleno emprego ainda neste ano- e o PIB deve crescer acima de
3%. O Fed [banco central americano] foi bem mais agressivo que as
autoridades no Japão ou que o Banco Central Europeu. O Fed deve esperar
até setembro para aumentar os juros vagarosamente. A consolidação fiscal
e a recapitalização dos bancos com dinheiro público aconteceram em 2009
-na Europa levaram mais de cinco anos. E os EUA têm uma economia e um
setor privado mais dinâmicos. É mais fácil para contratar e demitir, há
mais empreendedorismo, as indústrias do futuro estão aqui e o país está
no meio de uma revolução energética, com energia e combustíveis cada vez
mais baratos.
P: A desaceleração da China será suave e controlada, como diz o governo chinês?
N.R: Há visões extremas sobre a China, de pouso
forçado ou suave.Eu vejo um pouso com alguns solavancos, mas vai
continuar crescendo acima de 5,5, 6% ao ano. Não dá para continuar a
crescer como antes, criando investimentos errados ou se endividando.
Eles precisam de mais consumo doméstico e criar milhões de empregos
anualmente. Mas, com o envelhecimento da população, eles poderão crescer
menos sem deixar desempregados.
* Publicado originalmente na Folha de São Paulo
* Publicado originalmente na Folha de São Paulo
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