O “13 de
março” que passou à história do Brasil foi o do Comício da Central, no Rio
de Janeiro, em 1964. Tínhamos um governo de centro-esquerda, a esquerda
dispunha de certa força e achava que tinha mais. O movimento social crescia.
Comando Geral dos Trabalhadores, Ligas Camponesas, Sindicalismo Rural, União
Nacional dos Estudantes, Frente de Mobilização Popular, tudo pleiteando as
“reformas de base”. Crescia também a esperança de que aquelas “reformas” dariam
novo impulso ao país. Havia exageros e ilusões, mas nada que ameaçasse as
instituições democráticas da época.
Os que
usufruíam de privilégios sentiram-se ameaçados. Com a grande mídia, começaram a
pregar o golpe. “Marchas” foram feitas, para “salvar a democracia”. Três
governadores perfilaram-se nessa cantilena. O governo americano engajou-se para
“restabelecer a ordem” no hemisfério.
Quem
estava no Governo tinha a impressão de ter o Poder. Mas não tinha. Havia um
“Almirante do Povo”, Cândido Aragão, comandando os Fuzileiros Navais, um
“Marechal do Povo”, Osvino Alves, presidindo a Petrobras, um “dispositivo
militar”, mais ou menos desconhecido. E só. O golpismo cresceu, capitaneado
pelas forças mais retrógradas do país e, dezoito dias depois, o Governo foi
derrubado.
Para
“salvar a democracia”, destruíram-na. E destroçada ela ficou por 21 anos. Os
três “chefes civis” do Golpe foram alijados. O que governava São Paulo, Ademar
de Barros, foi cassado e morreu no exílio. O que governava Minas terminou
isolado na Oposição. E o principal deles, Carlos Lacerda, que governava o Rio,
e que denunciava o “mar de lama”, foi preso em 1968. Parte da mídia golpista
passou a funcionar com censores na redação.
O
cotidiano mudou. Ao invés de passeatas, discursos, reivindicações, greves,
essas coisas naturais à democracia, vieram “atos institucionais”, cassação de
parlamentares e juízes, perseguições, intervenção em sindicatos, fim de
eleições diretas, arrocho salarial, constituição outorgada, prisões, torturas e
assassinatos.
A preço
elevado, a sociedade conseguiu por fim à ditadura. Discutiu e votou uma
Constituição, talvez a que defina mais “direitos” no mundo. Passou
às eleições diretas. Chegou a eleger um presidente operário e uma mulher, fatos
raros no planeta. Chegamos a ser a 7ª economia do mundo, com uma
novidade: retiramos da faixa de pobreza algo como 44 milhões de pessoas.
Multidões tiveram, pela primeira vez, acesso regular a comida, a salário
razoável, a carro, a casa própria, a universidade, a viagem de avião, isto que
levou a colunista Danuza Leão a escrever, irritada, que corria o risco de
“encontrar em Paris o porteiro do seu prédio”.
Problemas
subsistem, outros surgiram, fruto da nova conformação social e das novas
exigências. A maré dos negócios internacionais passou a ser de vazante. E o
velho problema da corrupção reapareceu, só que desta vez com investigações
liberadas e prisões de gente que sempre fez falcatrua e nunca foi presa.
A
Petrobras, a maior empresa de capital aberto do mundo em produção de petróleo,
que tem uma das maiores reservas de óleo do planeta e que descobriu e
desbaratou uma quadrilha de facínoras que a saqueava, de repente foi
transformada em uma empresa-problema, de pequeno valor, despertando em grupos
externos interesses em sua privatização.
Após o
“13 de março” de 1964, com o crescimento do golpismo e movimentação de
tropa estrangeira, o Brasil foi derrotado, em 31 de março de 1964.
Esse “13
de março” de 2015 levanta um objetivo grandioso, a defesa da Petrobras, orgulho
de todos os brasileiros, que querem rigor na apuração e punição do esquema
corrupto e a Petrobras ilesa.
Diferentemente
de 51 anos atrás, depois desse “13 de março”, o golpismo deve ser repelido com
energia. Não poderemos brincar com nosso futuro, com a quebra das instituições
democráticas, com um impeachment descabido da presidenta recém-eleita, com a
volta do militarismo e coisas semelhantes. Tudo isso é amálgama de discurso
antibrasileiro.
*Haroldo
Lima é consultor na área de petróleo e integrante do Comitê Central do PCdoB.
Texto publicado no jornal A Tarde
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