Publicado no UOL
Josias de Souza
02/02/2017 12:44
“Sem sorte, não se chupa nem um Chica-bon”, dizia
Nelson Rodrigues. “Você pode engasgar com o palito ou ser atropelado pela
carrocinha” de sorvete. O Brasil teve sorte. Deu Edson Fachin no sorteio eletrônico do Supremo Tribunal Federal que definiu
o nome do novo relator da Lava Jato.
Fachin está sujeito a erros, como todo ser humano.
Entretanto, já demonstrou ter consciência de que não foi indicado à Suprema
Corte para fazer favores, mas para julgar segundo as leis. Fez isso ao relatar
ação do PCdoB contra o rito fixado por Eduardo Cunha para a tramitação do
impeachment de Dilma Rousseff.
Indicado por Dilma, para quem pedira votos em 2010,
Fachin votou pela manutenção do rito definido por Cunha. Seu colega Luís
Roberto Barroso inaugurou uma divergência, seguida pela maioria da Suprema
Corte. A Câmara foi compelida a seguir não o rito de Cunha, mas as regras que
embalaram o processo de impedimento de Fernando Collor, em 1992. Vencido,
Fachin anexou à sua biografia de magistrado um certificado de independência.
Fachin voltou a compor a minoria na sessão em que o
Supremo decidiu que o réu Renan Calheiros não podia assumir a Presidência da
República, mas tinha o direito de permanecer na presidência do Senado. Vencido,
o novo relator da Lava Jato apegou-se ao voto que já havia proferido em sessão
anterior. Recusou-se a abandonar a tese segundo a qual os réus devem ser
expurgados dos cargos que ficam na linha de sucessão do Planalto.
Para desassossego dos corruptos, Fachin juntou-se à
maioria do Supremo no julgamento em que ficou assentado que condenados em
segunda instância devem aguardar pelo julgamento de eventuais recursos atrás
das grades. Nessa matéria, fez mais: guerreou pela preservação da coerência da
Suprema Corte.
No exercício do plantão durante um recesso do
Judiciário, o então presidente Ricardo Lewandowski mandou soltar José Vieira da
Silva. Alegou que era preciso “prestigiar o princípio da presunção da
inocência”. Prefeito de Marizópolis, cidade dos fundões da Paraíba, Vieira da
Silva fora condenado por um tribunal de segunda instância.
Terminadas as férias, Fachin ordenou que o prefeito
fosse recolhido novamente ao xadrez. Para justificar a revisão do despacho de
Lewandowski, sustentou a necessidade de prestigiar a “estabilidade” dos
entendimentos fixados em decisões da Suprema Corte. O novo relator da Lava Jato
é um cultor da jurisprudência.
Se a escolha aleatória do computador
do Supremo Tribunal Federal tivesse recaído sobre uma toga da linha Lewandowski,
um palito de sorvete seria atravessado na traqueia dos membros da força-tarefa
da Lava Jato. Delatados, investigados, denunciados e réus chupariam sorvetes
até a eternidade. Com Fachin, os Deuses da aleatoriedade deram uma chance à
sorte.
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