Ustra é condenado a indenizar família de jornalista
Coronel comandava DOI de SP quando Luiz Merlino foi torturado e assassinado; juíza não vê confronto com Lei da Anistia
Leonardo Guandeline
SÃO PAULO. A Justiça de São Paulo condenou o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra a indenizar a viúva e a irmã do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino. Pelos relatos de testemunhas obtidos pela Justiça, Merlino foi torturado e morto em julho de 1971, nas dependências do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) de São Paulo, comandado na época pelo militar. O valor da indenização é de R$ 50 mil para cada uma. A decisão ainda cabe recurso.
Merlino era militante do Partido Operário Comunista. Em 14 de julho de 1971, foi capturado por militares ao visitar a família em Santos, no litoral paulista. Antes de morto, segundo testemunhas, cinco dias depois, foi torturado por cerca de 24 horas ininterruptas e abandonado numa solitária, nas dependências do DOI-Codi, na capital. As sequelas da tortura no pau de arara levaram o jornalista à morte. Em seu atestado de óbito, escrito pelos militares, consta que o jornalista foi atropelado ao fugir da escolta que o levava para Porto Alegre.
Segundo a juíza Claudia de Lima Menge, da 20ª Vara Cível de São Paulo, "a prova oral deu integral respaldo ao relato feito constante da inicial. Narraram as testemunhas a dinâmica dos eventos, a elevada brutalidade dos espancamentos a que foi submetido o companheiro e irmão das autoras, que o levaram à morte, ora sob comando, ora sob atuação direta do requerido, na qualidade de comandante do DOI-CODI e da Oban (Operação Bandeirante), vinculadas à manutenção e proteção do regime militar".
O advogado de Ustra, Paulo Alves Esteves, disse ao GLOBO que pretende recorrer da decisão, baseado na Lei da Anistia.
- Essa condenação viola a legislação, a Lei da Anistia. Por outro lado, a lei 10.559 estabelece que a indenização a todos aqueles que foram prejudicados seja feita pelo poder público - disse Esteves, que tem 15 dias para apresentar o recurso.
Mas, segundo a juíza, o processo não guarda relação com a Lei de Anistia, de 1979, por esta ser "de âmbito exclusivamente penal". "Não é de olvidar, porém, que até mesmo a anistia assim referendada pela Corte Suprema não está infensa a discussões, tendo em conta subsequente julgamento proferido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), em que o Brasil foi condenado pelo desaparecimento de militantes na Guerrilha do Araguaia, enquadrados os fatos como crimes contra a humanidade e declaradosimprescritíveis", destacou a juíza.
Em 22 de maio, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia adiado a análise de recurso contra a sentença que declarou Ustra responsável pela tortura do casal de ex-presos políticos Maria Amélia de Almeida Teles e César Augusto Teles, durante o regime militar. Na ocasião, nem o coronel e seus advogados foram à audiência. A ação da família Teles tem caráter exclusivamente declaratório: não pode resultar em condenação ou outro tipo de responsabilização.
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