quarta-feira, 18 de maio de 2016

Errou Feio

alexandre vidal porto
alexandre vidal porto
Escritor e diplomata, mestre em direito (Harvard). Serviu na missão na ONU e no Chile, EUA, México e Japão. É autor de "Sergio Y. vai à América" (Cia das Letras). Escreve às terças.
        
Pedro Ladeira - 12.mai.2016/Folhapress
O presidente em exercício, Michel Temer, discursa depois da posse dos ministros na quinta-feira (12)
O presidente em exercício, Michel Temer, discursa depois da posse dos ministros na quinta-feira (12)

"Não basta que a mulher de César seja honesta, é preciso que pareça honesta." Parto desse ditado machista —a propósito de Pompeia, mulher do imperador romano Julio César—, para comentar a inacreditável pisada de bola do governo Michel Temer ao não incluir mulheres ou minorias em seu gabinete ministerial.
Perguntas que não querem calar: em qual país do mundo essa ausência de mulheres seria aceitável? Estatisticamente, qual a probabilidade de que não haja negros no ministério de um país com quase metade da população negra?
Você teria simpatia por esse país, que exclui mulheres e minorias do comando político? Você gostaria de visitá-lo nas férias? Compraria produtos vindos de um lugar tão tosco e atrasado?
Esse país é o nosso.
O passo em falso causou dano feio à imagem do Brasil. Como explicar ao mundo que um governo é legítimo e bem-intencionado quando ignora um princípio de representação tão básico como o equilíbrio de gênero?
Alguém se lembrou de que o Brasil é o atual presidente da Comissão da Situação da Mulher na ONU? Como justificar à comunidade internacional tal despautério?
Todo gabinete ministerial tem caráter simbólico. Deve representar as forças políticas e os valores do país. Ao excluir mulheres e minorias, o recado do governo parece claro: vocês não fazem parte, vocês não terão voz.
Com a formação atual de seu ministério, o Brasil se afasta do mundo civilizado. O diálogo internacional entre países democráticos exclui quem dá mostras de discriminação. Se o Brasil quiser mesmo virar a página e se engajar com o progresso, esse gabinete vai ter de mudar.
Na sanha de dividir o butim do governo, os partidos desconsideraram a existência de mais da metade da população brasileira. Toda a contribuição econômica e o peso político da mulher e das minorias foram menosprezados. Trata-se de um erro político básico e de enorme repercussão.
Sabe-se que o ministério foi montado de forma açodada para refletir o equilíbrio de forças que apoiou a saída de Dilma. No processo, os membros do Legislativo se apoderaram do Executivo, esquecendo-se de que os cargos que ambicionam têm finalidade substantiva e requerem capacitação específica de quem os ocupa. Não basta ser manda-chuva de partido.
Partidos políticos não podem ser representados apenas por deputados e senadores. Devem ter quadros qualificados, capazes de formular e levar a cabo, com conhecimento técnico e eficiência, as políticas públicas do Executivo. Do contrário, é desgoverno.
"Os partidos não indicaram mulheres", justificou o Planalto, que já entendeu o erro feio que cometeu. Falta entender, no entanto, que indicações tardias de mulheres para cargos de segundo escalão em nada resolverão o problema.
O que o governo deve fazer agora é vestir as sandálias da humildade e reconhecer e corrigir seu erro, incluindo no gabinete mulheres, negros e representantes da diversidade nacional.
Não é possível que o governo se mostre excludente num momento em que o país precisa tanto de união. Cabe ao presidente fazer ver ao Congresso que seu comportamento anacrônico é inaceitável e deletério para a sociedade brasileira. Aos que julgavam ser possível ignorar mulheres e minorias, fica um conselho: melhor reavaliar.


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Em dois dias, duas declarações polêmicas de ministros de Temer são "desditas".













Falas de Alexandre de Moraes (topo à dir.) e Ricardo Barros, ministros de Temer, foram 'desditas'.©

Foto: Fornecido por BBC Falas de Alexandre de Moraes (topo à dir.) e Ricardo Barros, ministros de Temer, foram 'desditas'.



Até a manhã da última segunda-feira, o ministro da Justiça de Michel Temer defendia autonomia para a Presidência da República na escolha do chefe máximo do Ministério Público Federal - um dos principais responsáveis por investigações de corrupção entre políticos. Horas depois, a afirmação foi desautorizada pelo presidente interino.
Em entrevista publicada nesta terça pelo mesmo jornal Folha de S. Paulo, o novo ministro da Saúde afirmou que o governo poderá "repactuar" direitos universais previstos na Constituição, como a saúde, por arrecadar menos do que gasta. Horas depois, recuou e disse que o SUS (Sistema Único de Saúde) é um direito garantido.
Com isso, em dois dias, dois anúncios que geraram críticas ao governo interino tiveram o mesmo fim: foram automaticamente "desditos", seja pelo presidente em exercício, seja pelos próprios ministros envolvidos











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