terça-feira, 5 de maio de 2015

Fazenda trava a vinda da JAC Motors

      
Patrícia França
Edição A Tarde de 4/5/2015
B2 - Politica
     
  • Margarida Neide | Ag. A TARDE
    James Correia, empresário e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico da Bahia - Foto: Margarida Neide | Ag. A TARDE
    James Correia, empresário e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico da Bahia
Depois de seis anos conduzindo a política de atração de investimentos no estado,  tarefa iniciada ainda no governo de Jaques Wagner (PT), o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico James Correia volta à condição de empresário dos setor de gás, petróleo e energia. Nesta entrevista concedida na última terça-feira, três dias após deixar o posto, Correia faz críticas à gestão de Rui Costa (PT), condena a ocupação de cargos técnicos em órgãos do governo pelos partidos e diz que o "conservadorismo"  da Fazenda dificulta a vinda de novas empresas para a Bahia
 
O senhor deixa o governo do petista Rui Costa após bater de frente com o vice, João Leão. Como foi isso?
 
Não tive atrito com João Leão. Houve uma divergência em relação a duas diretorias da Sudic (Superintendência de Desenvolvimento Industrial e Comercial) que, defendi, deveria se preservar  a ocupação por pessoas da área técnica. 
 
O senhor acha que o governo peca ao ceder diretorias técnicas para atender partidos da aliança, no caso da Sudic ao PP de João Leão?
 
A política de aliança já tinha colocado o PP na presidência e na diretoria financeira da Sudic. Ao longo do governo do PT na Bahia a distribuição de cargos sempre privilegiou o equilíbrio entre o partido que estava assumindo e a manutenção da parte técnica dessas empresas. Num primeiro momento o governador acatou, reviu inclusive a substituição. Depois me colocou que havia um compromisso anterior (com o PP) e que seria necessário fazer a substituição de um diretor, o  que, acredito, deva acontecer.
 
O senhor acha que o vice-governador, que está sendo investigado pela Operação Lava Jato, deveria se afastar do  governo?

O Bonitão, Bonitão? É assim que ele se dirige às pessoas. Não, não. Ninguém pode ser condenado antecipadamente, o processo está começando e terá desdobramentos.

Houve outros casos como o da Sudic na sua pasta?

Houve no Ibametro uma tentativa de substituir outros diretores para atender ao PDT, o que levou a um questionamento do próprio Inmetro (instituto federal vinculado ao Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio).  É preciso entender que o Ibametro faz toda a parte de proteção do consumidor no estado da Bahia, define peso dos produtos, embalagem, faz aferição das bombas de combustível. 

No Ibametro, o PDT acabou indicando um técnico?

Até o momento da minha saída não havia substituição. Mas discutindo com Inmetro, que dá a palavra final sobre ocupação dos cargos, conforme contrato firmado com o governo da Bahia, achamos que as substituições que estão sendo propostas pelo presidente do Ibametro (Randerson Leal, filho do deputado estadual Roberto Carlos, do PDT) não podiam ser realizadas. O PDT indicou, além da presidência, um nome para a diretoria financeira. O que não dá é a tentativa de indicar um diretor de 25 anos, que nunca trabalhou na vida. Há necessidade da preservação dessa capacitação técnica e compromisso com a gestão. Na Sudic, o que eu questionava é que nós temos mais de R$ 2 bilhões em terrenos e tem que ter técnicos conduzindo isso. Então, acho que os governos têm que amadurecer para, nas negociações políticas, incluir menos estes cargos, que são essencialmente técnicos.

Um pouco antes dessa questão da Sudic, o senhor fez críticas à Desenbahia, pela não liberação de R$ 120 milhões para instalação da fábrica da JAC Motors, em Camaçari...
 
Acho que tanto no caso da JAC Motors como da Foton (fabricante chinês de caminhões), dois projetos importantes para o setor automotivo baiano, houve um conservadorismo muito grande. Nós estamos entrando em uma fase (crise econômica) que é preciso ter muito cuidado com uma atuação muito conservadora da Secretaria da Fazenda, que coordena o conselho da Desenbahia. Essa posição conservadora não foi apenas nestes casos, mas em outros projetos de atração de investimento em que não existe nenhum impedimento para aprovação. Acho que o governador precisa ter um pouco de cuidado para preservar o equilíbrio entre desenvolvimento e a Fazenda. Precisamos atrair o máximo possível de empresas, que só vão ter no futuro algum impacto sobre a arrecadação, ou seja, vão deixar de pagar quilo que supostamente pagariam. Então, esse conservadorismo dificultou a solução da Foton e da JAC e tem dificultado outras  empresas de se instalarem no estado.

A fábrica da JAC Motors estava prevista para ser inaugurada este ano e, sem o empréstimo da Desenbahia, foi adiada para 2016. O senhor sai  frustrado, já que foi um projeto da sua gestão no governo de Jaques Wagner?

Minha única frustração foi, realmente, não ter conseguido levar adiante os projetos da JAC Motors e da Foton. Tínhamos todas as condições de implantar os dois projetos. O governo do estado investiu R$ 28 milhões para desapropriação o terreno que abrigará a JAC Motors, investiu quase R$ 100 milhões dando incentivos fiscais para importação dos veículos. Ou seja, faltava mais este investimento. Na minha visão, as garantias que foram fornecidas (pelo grupo SHC) seriam suficientes para a execução do projeto.

A Bahia pode ficar sem a montadora?

Acho que temos dificuldades tanto com a JAC como com a Foton. Se as negociações com a Foton não avançarem, corre o risco de ela ir para o Rio Grande do Sul. E a JAC corre o risco de ser implantada no Rio de Janeiro. Como o mercado automotivo não está muito bem, as vendas caíram 20%, talvez isso ajude um pouco a Bahia, com as empresas acompanhando com mais calma a discussão.

O senhor falou em excesso de conservadorismo. Neste momento de crise econômica, com alta de inflação e desemprego, a Bahia precisaria ser mais ousada?

Não podemos ser muito conservadores, temos que ser responsáveis. Não podemos atrapalhar as empresas que querem vir para a Bahia. Temos aquelas regras que estão na nossa legislação e tudo que estiver sendo pleiteado dentro daquela perspectiva tem que ser atendida. Quando eu falo em conservadorismo é o que houve no final do ano passado, que para a gente assinar um simples protocolo na Fazenda (comandada pelo secretário Manoel Vitório), demoramos mais que o tempo de fazer uma licença ambiental (que em regra leva meses). Então, é uma situação que preocupa em tempo de crise, em que precisamos ser ágeis para atrair o máximo de empresas.

Pelo que o senhor coloca, é a Fazenda que está emperrando a vinda de mais investimentos para a Bahia. Houve uma dificuldade de diálogo seu com o secretário Manoel Vitório?

Não houve dificuldade de diálogo, mas de convencimento. Por isso que eu acho que há uma visão extremamente conservadora da Fazenda em relação a uma série de questões. Nós estávamos para trazer uma indústria grande, que fabrica armários, eletrodomésticos, para Feira de Santana. Ele não liberou (incentivos) alegando que a empresa já tem uma pequena fábrica em Juazeiro, e que poderia ser fechada com a nova unidade em Feira. Que lógica tem isso? Se a empresa tem interesse em colocar uma unidade muito maior em Feira de Santana, que lógica tem em se preocupar com a fábrica montada em Juazeiro? São coisas que não têm sentido dentro de uma política de atração de investimento. Temos que pensar numa Bahia bem maior.

Essa visão que o senhor critica pode comprometer o desenvolvimento da Bahia, cuja economia vem perdendo posição em relação a outros estados?

Acho que corremos o risco de termos uma agilidade muito menor do que tem Pernambuco, por exemplo. Na Bahia construímos uma política de atração de investimentos que envolve a Fazenda e as secretarias de Meio Ambiente e Infraestrutura. Há temas que são tratados por estas secretarias, principalmente a Fazenda. Então, essa postura mais conservadora aconteceu mais recentemente, quando a crise se acentuou.  

Foto: Margaridae Neide | Ag. A TARDE
Os grandes projetos de infraestrutura para a Bahia, como o Porto Sul (Ilhéus) e a ferrovia Oeste-Leste, não se efetivaram. Há problemas em aeroportos, em estradas. Por que não se conseguiu, em oito anos de governo, avançar nessa importante demanda? 

O governo Wagner conduziu um projeto muito estratégico, ligando o oeste até o sul baianos, com o porto, para revitalizar as indústrias em Ilhéus. Foi feito o estaleiro Paraguaçu, em Maragojipe, que está praticamente pronto, mas com a crise na Petrobras nós tivemos dificuldades, já que o único cliente era a estatal petrolífera  (as obras finais foram paralisadas porque três das quatro empresas responsáveis pelo empreendimento são investigadas na Operação Lava Jato - Odebrecht, OAS e Constran-UTC). A Ferrovia Oeste-Leste está com a obra atrasada e a Bamin (Bahia Mineração), que vai construir o Porto Sul, enfrenta dificuldades societárias. Então, eu tenho esperança que estes dois projetos estruturantes - um para o Recôncavo e o outro para o eixo oeste - sejam resolvidos. Mesmo porque nós temos R$ 31 bilhões cadastrados no governo do estado em mineração, que só sairão se a Ferrovia Oeste-Leste for  concluída. 

Os efeitos do petrolão, então, são muito danosos para a Bahia, não é?
 
Para o Brasil todo é muito ruim. E para a Bahia. Nós temos a segunda maior refinaria do Brasil (RLAM, em São Francisco do Conde), temos a parte de produção de petróleo e gás. Então vejo que a grande dificuldade para a Bahia é a restrição de investimentos. Tínhamos perspectivas de fazer investimento no mar, offshores da Petrobras, e temos agora dificuldade por conta de orçamento.

Como está o impasse no contrato especial que a Chesf tem com as indústrias eletrointensivas instaladas  no Nordeste e que, se não for renovado,  aumentará os custos dessas empresas?

Essa questão foi gerada há cinco anos, quando os contratos deveriam ser renovados e a então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, questionava por que o governo iria renovar este contrato sem que as empresas fizessem investimentos em geração, para justificar uma tarifa mais baixa. Cinco anos depois, estamos vivendo o mesmo impasse, só que, agora, Dilma presidente. Foi aprovada, inclusive, uma lei no Congresso prorrogando o contrato das indústrias com a Chesf, que ela vetou. Mas temos que encontrar uma solução.

Essa questão energética afeta quais empresas na Bahia?

Dow Química, Braskem, Ferbasa, Paranapanema, Vale, Gerdau e Mineração Caraíba. São companhias muito grandes (juntas representam 60% do ICMS arrecadado pelo governo da Bahia) e elas querem renovar seus contratos (firmados há 30 anos) pelo mesmo preço, em torno de R$ 110 R$ 115 o megawatt-hora (MWh). Acho que deve haver uma renovação, nem que seja temporária. Como a solução que se pensou anteriormente, dessas empresas investirem em energia eólica sob a coordenação da Chesf, não aconteceu, vamos aguardar como será concluída esta negociação. Só temos dois meses, e se os contratos não forem renovados, as indústrias passarão a pagar R$ 650 pelo megawatt-hora de energia.

Agora fora do governo, o senhor reassume suas funções de empresário nas áreas de gás, petróleo e energia. O senhor vai investir na Bahia?

Tenho investimentos na Bahia. Estou construindo 27 galpões para alugar na estrada CIA-Aeroporto, tenho um patrimônio, capacidade para investir. Também tenho negócios no Maranhão, na área de gás, e estou iniciando um negócio nos Estados Unidos, em portos.

É mais fácil investir em portos lá do que aqui?


Ah... muito mais. Há três anos não tínhamos legislação no Brasil. O ex-governador Wagner  tentou privatizar o Porto de Aratu, que seria a melhor solução. Todas as grandes empresas, a Braskem, a Paranapanema, participariam em consórcio, mas ele não conseguiu. Agora, o que tem dado certo na Bahia são os terminais de uso privativo. Hoje, 75% de todas as cargas transportadas na Bahia são através de terminais de uso privativo.

Então a solução é privatizar?

Não sei se a solução seria privatizar, mas investir em novos portos privados. O Moinho Dias Branco, por exemplo, transporta todos os grãos da Bahia (Porto de Aratu foi concebido inicialmente para atender ao Moinho). Se não tivéssemos o Moinho Dias Branco, íamos transportar por onde?

O governo Lula e a presidente Dilma erraram em manter esse setor, que só agora começa a ir para iniciativa privada, na mão do governo?

Acho que erraram. Imagina uma Coelba pública tendo que investir R$ 1 bilhão por ano como vem fazendo? Lula e Dilma foram conservadores em não ter privatizado os portos. Isso atrasou muito o desenvolvimento da economia do país.

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