segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Mina na Bahia tem 'project finance' puro

Modelo de financiamento usado para viabilizar obras de infraestrutura, onde os riscos de implantação são isolados no projeto

Era 1998 quando Ubiratan Moura deixou Salvador e voltou a Maracás (BA), sua cidade natal, movido pela esperança de trabalhar em uma mina que, contava seu pai, seria aberta ali.
O projeto demorou a vingar e Moura passou os anos seguintes ganhando a vida como transportador de melancias até que, em 2010, a Vanádio de Maracás começou a sair do papel. A companhia vai investir na produção de vanádio, minério com alta resistência a choques e à corrosão.
"Há muito tempo se ouvia falar no projeto de uma mina. Descobriram o minério nos anos 70 e meu pai trabalhou na geofísica e sempre falava que um dia as coisas iam acontecer", afirma Moura, que hoje trabalha o laboratório da Vanádio de Maracás. "Muita gente desistiu, mas deu certo."
Controlada pela canadense Largo Resources, a Vanádio de Maracás foi erguida a partir de uma estrutura de financiamento complexa e pouco comum no Brasil: o project finance "puro". Nessa modalidade, os riscos de implantação são isolados no projeto e, em caso de inadimplência ou não conclusão das obras, não se pode recorrer aos acionistas.
A essência do project finance - modelo de financiamento usado para viabilizar obras de infraestrutura - é que o pagamento da dívida venha do fluxo de caixa futuro do projeto em construção. A ideia é que os riscos fiquem limitados à sociedade de propósito específico criada para abrigar a operação. Na prática, porém, o que se vê no mercado brasileiro é um modelo híbrido, em que os acionistas oferecem garantias bancárias de forma a reduzir custos.
Estruturas como a da Vanádio de Maracás, sem possibilidade de recurso aos acionistas, representam menos de 10% do total de operações de project finance no Brasil, estimam executivos de bancos que atuam na área. A expectativa, porém, é que a prática se torne mais frequente à medida que se esgotarem as fontes tradicionais de financiamento ao setor.
Embora seja mais caro, o grande atrativo desse modelo é que ele não afeta os limites de crédito das companhias. Num momento em que grandes grupos têm investido em vários projetos de infraestrutura, limitar riscos e evitar dívidas adicionais podem ser medidas necessárias.
No caso da mineradora, o que permitiu que a operação fosse fechada dessa forma foi um colchão de garantias que permite o acesso dos credores aos recursos oriundos da operação.
"Se não fossem as garantias oferecidas aos bancos e se o projeto da empresa não estivesse bem elaborado, esse modelo não teria sido possível", diz Gabriela Denadai, superintendente de project finance do Itaú BBA para mineração e indústria.
A instituição foi responsável por estruturar a transação, que partiu praticamente do zero para levantar os US$ 275 milhões necessários ao projeto. A Largo Resources, fundada em meados 2000 pelo canadense Mark Brennan, não tinha capital para bancá-lo. Listada como companhia pré-operacional, havia investido na compra de direitos minerários ao redor do mundo - inclusive em Maracás - os US$ 20 milhões captados na Bolsa de Valores de Toronto.
Para contornar a limitação, a Largo costurou um aporte de fundos de investimento, que lhe permitiu entrar com US$ 110 milhões de capital próprio no projeto. Os US$ 165 milhões restantes vieram de empréstimos tomados sobretudo junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e garantidos por Itaú BBA, Banco Votorantim e Bradesco BBI.

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