quarta-feira, 23 de março de 2011

Valor Econômico
Cristiano Romero

Ideias para a concessão de aeroportos

É possível resolver os problemas emergenciais da infraestrutura aeroportuária do país com a concessão, ao setor privado, de quatro aeroportos: Guarulhos (São Paulo), Galeão, Viracopos e Juscelino Kubitscheck (Brasília). Dos 155,3 milhões de passageiros transportados em 2010 no Brasil, 58,9 milhões usaram esses quatro aeroportos. Ao lado de Congonhas, em São Paulo, e Santos Dumont, no Rio, são as unidades que têm registrado as taxas mais altas de crescimento.

Nos casos de Congonhas e Santos Dumont, a concessão, na avaliação de especialistas ouvidos por esta coluna, se faz desnecessária. Os dois aeroportos estão saturados e não há aumento de infraestrutura possível. Pelo menos num primeiro momento, as outras unidades do país continuariam sendo administradas pela Infraero. O governo autorizaria, ainda, a construção e a operação de novos aeroportos.

Segundo um estudioso do assunto, o Rio, por exemplo, vai precisar de um terceiro aeroporto dentro de três anos. São Paulo tem o mesmo problema e já há projeto, liderado pela Andrade Gutierrez, para construção de uma terceira unidade na capital paulista. As autoridades deveriam considerar seriamente essa possibilidade.

O ideal, diz um especialista, seria transformar Congonhas, hoje o segundo maior do país (15,4 milhões de passageiros no em 2010), num aeroporto para voos executivos e aviões menores, como o de



Campo de Marte. Isso reduziria o risco de acidentes graves em área central da cidade. O mesmo argumento valeria para o Santos Dumont, no Rio.

No novo arranjo, o aeroporto de Guarulhos, atualmente o maior do país e de longe o que recebe mais voos internacionais, passaria a ser usado apenas para voos domésticos. Enquanto isso, Viracopos, em Campinas, que tem grande capacidade de expansão, seria transformado em aeroporto internacional.

Essas mudanças dependeriam, evidentemente, da construção de trens ligando a capital paulista a seus dois principais aeroportos (Guarulhos e Viracopos). O projeto bilionário de construção do trem-bala, ligando Campinas a São Paulo e ao Rio, desvia, na avaliação de uma fonte oficial, o foco do problema. Tem um custo faraônico (R$ 34 bilhões) e é, por isso mesmo, inexequível.

A construção de um terceiro aeroporto em São Paulo não prejudicaria Viracopos porque este seria destinado principalmente a voos internacionais. Nesse modelo, o aeroporto de Brasília (o terceiro maior do país) cresceria e seria transformado num "hub", um centro de distribuição de voos domésticos e regionais (para a América do Sul).

O modelo sugerido por integrantes do setor privado, de leilão de aeroportos em blocos, de forma que os lucrativos compensem o investimento nos deficitários, não é bom porque instituiria o subsídio cruzado, criando ineficiências. As tarifas e taxas das unidades mais lucrativas teriam que ser maiores para subsidiar o funcionamento dos outros. O ideal é que, se houver, o subsídio seja explicitado e bancado por recursos públicos.

A abertura de capital da Infraero, um processo que, na avaliação do BNDES, não consumirá menos de dois anos, inviabilizaria as concessões porque, no futuro, se o governo decidisse pela concessão de novas unidades, teria dificuldade de retirar aeroportos do guarda-chuva da estatal. Haveria o risco de enfrentar sérios questionamentos jurídicos de seus acionistas privados.

Seja qual for o modelo, é preciso correr com as mudanças. Nos últimos quatro anos, apenas uma perna do setor aéreo se modernizou - o mercado de passageiros, favorecido pelos ventos liberalizantes soprados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Nos últimos quatro anos, o número de passageiros aumentou em mais de 50 milhões. Se a infraestrutura não for ampliada, haverá aumento de preços e exclusão de parcela significativa da população desse mercado.

Havia dúvidas, desde o governo Lula, quanto às ideias da presidente Dilma Rousseff sobre o setor aeroportuário, um dos mais carentes da infraestrutura nacional. Na entrevista que concedeu semana passada a Claudia Safatle, do Valor, a presidente, finalmente, deixou claro o que pretende fazer para enfrentar o problema. Falou em concessões, investimento privado e público, este onde for necessário. E assegurou que não tem "preconceito contra nenhuma forma de expansão do investimento nessa área".

Já durante a gestão Lula, Dilma quis trilhar o caminho das concessões, mas esbarrou no compromisso político do então presidente com as centrais sindicais. Segundo esse obscuro acerto, Lula não faria nada, em seu segundo mandato, que lembrasse uma privatização.

Diante da resistência de Lula, Dilma, então ministra da Casa Civil, começou a estudar a possibilidade de abertura do capital da Infraero, a estatal que administra 67 aeroportos federais. Seria uma forma de a empresa buscar recursos no mercado para fortalecer sua estrutura de capital e, assim, investir pesadamente na reforma e ampliação de aeroportos já existentes e na construção de novas unidades.

Numa reunião com empresários e representantes do BNDES, em fevereiro de 2008, Dilma ouviu do grupo que a abertura de capital não resolveria o problema por uma razão trivial: não haveria investidores interessados em colocar seus caraminguás na estatal, uma empresa inchada (tem 28 mil funcionários) e sem patrimônio (os aeroportos pertencem, em sua maioria, à União).

A então ministra, com a ajuda de dois governadores (Sérgio Cabral e José Serra), ainda tentou convencer Lula a fazer a concessão de dois aeroportos - Galeão e Viracopos. Como Lula nunca quis que a coisa andasse, embora tenha dito o contrário ao titular desta coluna em entrevista, a ideia não prosperou.

Agora, livre do compromisso político-ideológico do antecessor, a presidente Dilma prepara mudanças profundas nessa área. Nomeou um executivo competente para comandar a Infraero - Gustavo do Vale, que foi vice-presidente do Banco do Brasil e diretor do Banco Central -, criou uma secretaria com status de ministério para cuidar do setor e está à procura de outro executivo para gerir a nova secretaria. Para a Anac, deve optar pela continuidade, uma vez que a agência, na gestão de Solange Vieira, passou por processo inequívoco de modernização.

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