segunda-feira, 22 de junho de 2015

Cotidiano > Questão de medo



  O Medo delemita os espaços públicos                   
Bruno Aziz - Ag.ATarde



Ednalva mora na Liberdade e não atende o celular no ônibus. É porque chama atenção de ladrão. Edna mora na Graça e simplesmente não anda de ônibus. É porque, entre uma catraca e outra, já foi assaltada três vezes. Sílvio tem carro, mora em Brotas e não foi ver Carybé na Caixa Cultural. É porque aos domingos, quando tem tempo, a Carlos Gomes é deserta e perigosa de estacionar.

A maneira mais rápida de entender sua cidade é indo embora. Quando você volta, não tarda a perceber as reações dos amigos aos hábitos mais corriqueiros.  Em um punhado de dias em Salvador, colecionei uma penca de porquês. Por que não correr na orla de Amaralina de dia? Por que não transitar pela Vitória à noite? Por que não estacionar no Boulevard 161 de madrugada? Por que não andar displicentemente pela Waldemar Falcão a qualquer hora?

Um dos meus cunhados - que mora na capital - hoje em dia passa os fins de semana em uma praia do interior. Porque mais segura, na última se permite passear com o cachorro ou de bicicleta. Meu sogro - que mora no interior - faz o caminho inverso do ócio. Mas confessou-me desanimado com o roteiro de sempre. "É porque aqui as pessoas não passeiam pelas calçadas, não vivem as ruas. Estão sempre de carro ou ônibus, indo pra algum lugar". 

As pessoas não vivem suas ruas porque Salvador é violenta ou Salvador é violenta porque as pessoas não vivem suas ruas? Nem uma coisa, nem outra. Mas, em parte, a lógica Tostines se aplica. Lembro-me de outro dia perguntar a um colega paulista, recém-chegado das férias na Bahia, o que mais tinha achado bonito. "A Avenida Contorno. Mas por que quase não há pedestres por lá?".

Tenho uma profunda relação de afeto por Salvador. Foi onde vivi onze bons anos da vida, mas já nessa época lembro de esconder o relógio no cós da calça a depender de onde fosse. O medo delimita os espaços públicos. A questão é quando ele se torna maior do que a própria sensação de insegurança.

Pensargrande diz:
Sou do tempo  que em Salvador os vizinhos colocavam cadeiras a frente de suas casas para levar uma prosa com os amigos;
Sou do tempo que rapazes e moças iam a festa e voltavam pela madrugada andando pelas calçadas até regressar aos seus lares;
Sou do tempo em que poucos homicídios aconteciam, poucos roubos eram comentados e só tinha batedor de carteira e ou ladrão de galinhas...
O tempo passou, o progresso e a miséria de braços dados estão dando a nota em jornais falados, escritos e televisados.
Naquela época o medo não delimitava espaços, a praça, as ruas ,vielas, avenidas eram do povo.
E agora? Para onde vamos sem segurança?
Uma questão dentro de um raciocínio lógico difícil de responder.

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